Fundo de renda fixa com liquidez imediata: um problema. Por Caio Barbuio

Todo investidor sabe que antes de começar a investir em renda variável, ou em ativos menos líquidos, é preciso compor uma reserva de emergência. Essa é a parcela do seu portfólio que não deve correr riscos, pois precisa estar prontamente à disposição. O mais importante aqui não é o rendimento, mas a previsibilidade e a segurança.
Nos últimos anos, muitos pequenos investidores com certa aversão a risco migraram da poupança e dos títulos públicos pós-fixados para fundos de renda fixa de liquidez imediata, na expectativa de obterem uma rentabilidade acima da SELIC sem correr riscos. A migração para tais fundos de renda fixa foi fruto da indicação das corretoras que, ainda hoje, costumam sugerir esse tipo de produto financeiro sob o argumento de que apresentam baixíssima volatilidade.
No entanto, os investidores, sem saber, acabavam alocando recursos em um produto que continha crédito privado, o que na prática correspondia a emprestar dinheiro para empresas. Ou seja, os investidores ficavam expostos aos riscos de mercado e de crédito sem ter consciência disso, uma vez que, ludibriados pelas corretoras, interpretavam a baixa volatilidade como ausência de risco.
Durante muitos meses esses investidores obtiveram um retorno mensal razoavelmente constante, acima da Selic ou CDI. Eles pensavam: “Que bom! Não é muito, mas é melhor que deixar meu recurso aplicado em Tesouro Selic. Não preciso correr o risco da bolsa e ainda posso sacar quando quiser”. Enganaram-se todos.
Em março de 2020, quando surgiu a crise provocada pela Covid-19, os fundos de renda fixa de liquidez imediata chegaram a cair 3% (três por cento), prejudicando os investidores justo quando eles mais precisavam dos recursos. Muitas pessoas nem mesmo sabiam que esse tipo de fundo poderia sofrer rentabilidade negativa, dado que historicamente isso não ocorria. Pensava-se que, no máximo, se deixaria de ganhar, mas nunca perder.
Ficou evidente que, ao contrário do que sempre foi dito pelas corretoras, o principal problema desse tipo de investimento é o fato de ele possuir liquidez imediata. Em uma analogia contemporânea, pode-se dizer que o fundo de liquidez imediata possui o mesmo problema que uma sala de cinema.
Isso porque antigamente, ao se construir uma sala de cinema, o proprietário era obrigado a seguir rigorosas normas de segurança, que ainda hoje persistem. As portas precisavam possuir sinalizações luminosas; os materiais acústicos usados no forro e na parede precisavam ser apropriados, de lenta combustão em caso de incêndio; havia a necessidade de se colocar luzes a cada 40 centímetros para indicar a saída e etc.
Mesmo com tais normas de segurança, quando ocorria um incêndio, havia, quase sempre, vítimas fatais. E por quê? Por que o pânico gerado pelo incêndio era mais nocivo que o próprio incêndio.
Para minimizar esse problema, os engenheiros bolaram uma ideia simples: A instalação de portas anti-pânico, que só abrem de dentro para fora e possuem barras de 1,20 m de largura em vez de maçanetas, sendo possível abri-las utilizando apenas o antebraço.
Os fundos de renda fixa de liquidez imediata, tal qual uma antiga sala de cinema, ficam vulneráveis ao pânico dos investidores quando estes se deparam com uma crise, o que equivaleria ao incêndio nas antigas salas de cinema. Isto é, da mesma maneira que aquelas, esses fundos não possuem portas anti-pânico.
A título de exemplo, em março/2020, houve um enorme saque de recursos desse tipo de fundo. Muitas pessoas sacaram seus recursos, com o intuito de se salvaguardar da crise com dinheiro em “espécie”, ou sacá-lo para convertê-lo em alguma moeda forte como o dólar, o iene e o euro. Os gestores foram obrigados a resgatar seus recursos em um curto espaço de tempo, fazendo-o em um momento em que o mercado estava disfuncional, fato que desvalorizou muitos títulos.
Ficou demostrado que o Tesouro Selic é a melhor opção para o investidor deixar sua reserva de emergência. Mesmo com a Selic baixíssima, ainda que eventualmente este também possa ficar em terreno negativo, nunca será com a mesma magnitude dos fundos DI.
Caso deseje alocar recursos em Fundo DI, dê preferência aos fundos com um prazo de resgate mais dilatado, a partir de um mês. Um resgate maior protege o investidor contra ele mesmo, pois permite que o gestor resgate os títulos com mais tranquilidade sem provocar uma oferta excessiva num curto espaço de tempo; tal recurso funciona como uma espécie de porta anti-pânico.
Celina Ramalho